33: Depois de Salvarem um Mundo - Capítulo 200
O Retorno da Chama
Lee-Sen-Park estava em sua tenda, esperando pela chegada dos superiores para interrogá-lo. Desde a debandada geral dos heróis e pessoas livres, ele havia tentado a todo custo encontrar uma brecha para fugir.
Como se não bastasse ser prisioneiro em um mundo onde todos eram perigosos — até aquela criança com um cajado — Lee-Sen-Park estava com a impressão de vozes ecoando em sua mente desde que acordara da surra de André.
E como sua sorte parecia só piorar, ele viu André retornar. Ou melhor, ouviu a voz do seu pior pesadelo, aquele homem estranho, de voz ameaçadora e olhos frios, como os de quem havia morrido há muito tempo.
Apenas de receber aos ouvidos aquela voz aterrorizante, fez com que o coreano implorasse aos céus que o tirassem dali. Ou que pelo menos aumentassem as vozes em sua cabeça o suficiente para abafar a fala de André.
Então veio o silêncio.
Todas as vozes ao redor haviam desaparecido, até mesmo sua mente estava vazia, sem nenhum resquício de som. Então ele percebeu que não estava mais na tenda, amarrado à estaca com aquelas cordas grossas.
— Enfim chegou sua hora de ser útil! — disse uma voz grave ao seu lado.
Quando Lee-Sen-Park se virou, o que viu deixou-o sem palavras. Era um homem alto e loiro, usava uma armadura vermelha que parecia lava vulcânica, e estava coberto em chamas.
— Bem-vindo ao meu mundo particular, herói. — Cumprimentou o homem — Nós estávamos o esperando.
Bem longe do acampamento, o que restou da Aliança Internacional estava reunido em um grande acampamento militar cheio de tendas, geradores, tanques de guerra e até alguns aviões.
Com os portais fechados e a comunicação com o seu mundo de origem totalmente cortada, havia uma sensação de perigo rondando os soldados, apesar de seus superiores garantirem que estava tudo bem. O rumor que circulava, indicava que André havia, de alguma forma, destruído toda a AI e fechado os portais, sozinho.
Era praticamente impossível, mas se tratando de um herói, não era uma possibilidade a ser descartada. Ainda mais se tratando do último a retornar, a quem até mesmo os mais fortes temiam e contavam histórias que o tinham como vilão.
Pelo menos a morte de Elizabeth estava confirmada, outras estavam sob suspeita, e mesmo com Alice se declarando Rainha e cortando as conexões entre o Reino de Prata e a Aliança Internacional.
Ela havia alegado que queria seguir os passos de seu pai e ser uma pessoa digna, governando o reino que seus ancestrais construíram, e seus parentes atuais converteram em bagunça.
Juntando todos esses problemas, era quase impossível para um soldado da AI estar confiante e tranquilo, isso valia também para Glover, o tenente da Aliança que quase um ano antes tentou convencer André a se juntar a eles.
Glover lembrava ainda do sentimento que teve ao ser encarado por André, e como o rapaz havia, em segundo, eliminado um grupo de elite do exército. Agora ele estava com o a mesma sensação de perigo.
Não bastando todas aquelas nuvens escuras escondendo o céu em todas as direções, Glover estranhava mais uma coisa: Deveria ser madrugada, mas o calor estava mais intenso do que durante o dia. Na verdade, parecia que a cada segundo aumentava um grau na temperatura do ambiente.
No momento que o relógio digital no pulso de Glover soou, avisando-o que eram seis da manhã, uma luz verde brilhou no horizonte, quilômetros à sua frente. Um brilho forte e quente, como receber um abraço após uma viagem solitária.
Glover até sorriu de felicidade.
— O sol está nascendo? — Se admirou um dos soldados.
— Mas o sol não é verde… e essa luz vem do oeste. — Outro soldado comentou.
— Ah… Acho que não é o sol. — Glover concluiu.
Sobre o horizonte ao oeste pairava uma luz intensa, como se o sol estivesse nascendo no sentido contrário. Muitos soldados lembraram das lendas de que um dia o sol nasceria no oeste, e esse seria o início do apocalipse naquele mundo.
O alvoroço iniciou-se, o pânico foi se generalizando, até mesmo os militares de patente mais alta não sabiam o que estava acontecendo e tinham dificuldade em estabelecer uma voz de comando.
Tudo por causa de uma lenda? Não. Era por causa de uma mulher em chamas, trajando uma armadura vermelha, de pé sobre um tanque parcialmente derretido. Sua presença era suficiente para causar medo em qualquer um, e ela não parecia fazer questão do contrário.
Ela estava em chamas, mas não eram chamas comuns, estas eram esverdeadas.
— Não se preocupem, mortais. — Uma voz etérea soou, como se duas vozes estivessem sobrepostas — Eu não me importo com suas vidas miseráveis, vocês apenas estavam no meu caminho.
— Q-quem é vo-você? — Um soldado gritou, gastando o que lhe restava de coragem.
— Eu sou o sol, eu sou a chama, EU SOU ELIZABETH, a deusa do fogo e da vida!
Conforme a luz intensa que vinha do oeste iluminava todo o continente, as pessoas que restavam no acampamento de guerra se aglomeravam para escalar as formações rochosas que dividiam o deserto frio do Sul e a planície fértil do Leste.
Todos queriam admirar o surgimento de um sol que marcaria uma nova era naquele mundo, conforme a antiga profecia que todos conheciam muito bem. Aquele momento era um marco na história, que muitos deles contariam para seus netos.
André, diferente da maioria — como sempre — teve sua atenção atraída por outra coisa. Conforme ele deu as costas e foi para uma das tendas, Leonardo fez um sinal para Lucas, e ambos seguiram André.
Logo os dois descobriram o que havia raptado a atenção de André. A tenda estava em chamas, e lá dentro Lee-Sen-Park permanecia sentado. Seu corpo estava coberto por chamas azuis, semelhantes às que Elizabeth havia utilizado contra ele. Mas o fogo parecia flutuar sobre sua pele, não queimando sequer sua roupa.
— Então você mentiu sobre ter perdido seus poderes? — Leonardo gritou, apontando o dedo para o homem em chamas.
— Senhores, senhores… — Lee-Sen-Park disse — Eu fui escolhido para ser o novo herói da chama pela própria deusa do fogo. Quem diria? Aquela que mataram, voltou à vida com força total.
E conforme os olhos se arregalavam, ele continuou:
— Isso mesmo, senhores. Elizabeth está de volta! A Zita voltou! Ha-ha-ha!
O alvoroço se formou, pessoas admiradas, felizes e com medo. Apenas André permaneceu impassivo com aquele breve discurso de Lee-Sem-Park. Mas, se alguém observasse bem, teria visto por um breve momento, um pequeno sorriso se formando no rosto dele.